terça-feira, 2 de agosto de 2011

Missa de Trigésimo Dia de Meu Pai

Ao tempo que esta postagem está indo ao ar, está se realizando na Igreja de São Pedro, o santo dos pescadores, a missa de passagens de 30 dias da morte de meu pai.

Recebi ontem de minha irmã sua última carta ao meu pai, que emocionou-me e reproduzo abaixo.



"Painho,

Essa é mais uma das muitas cartas que trocamos ao longo de nossas vidas, mas que tem um caráter especial por ser a que encerra um ciclo de nossa existência, ou seja, o período em que nos encontramos e caminhamos juntos aqui na terra. Por isso, como aprendi um dia com o pai de uma grande amiga minha, quero começar agradecendo a Deus por essa oportunidade que tivemos de estarmos juntos por esse tempo que Ele nos concedeu.

Na verdade, acho que vou até te decepcionar um pouco, pois dessa vez não tenho nada a contestar ou debater com você, como sei que tanto gostava. Nesse momento, escrevo apenas para declarar, mais uma vez, o imenso amor e admiração que tenho e sempre tive por você.

Nesses últimos dias, coube a nós, sua amada família, a dolorosa experiência de atravesarmos os primeiros dias de nossas vidas sem a sua presença.... e que falta você nos faz..... De repente, nos damos conta de que nunca, em circunstância nenhuma de nossas já avançadas vidas, você deixou de estar presente de alguma forma.

Como pôde ser tão grande e tão marcante, sendo tão reservado e discreto? Embora você julgasse que tinha dificuldades em interagir e em se comunicar com as pessoas, na verdade, isso sempre foi um equívoco de sua parte, pois como te disse muitas vezes, você se comunicava e acabava por impor a sua presença e suas convicções simplesmente com a sua existência, com o seu exemplo de vida e pelas obras que realizava por todos os lugares por onde andava e sem precisar fazer nenhum esforço para isso..

Como você mesmo costumava dizer nos últimos anos de sua vida, você foi um homem pleno e feliz em tudo que fez e para mim – tenho certeza que também para toda a sua família e para aqueles que tiveram o privilégio de te conhecer - a fonte de sua grandeza reside justamente aí: na felicidade e simplicidade que naturalmente habitava o seu ser e na sua generosidade - que sempre esteve aliada à firmeza de propósitos e à incomensuravel e inabalável integridade com que sempre conduziu tudo que empreendeu, inclusive a sua própria e tão linda família.
Tudo isso pode ser traduzido na sua capacidade inesgotável de amar - um amor incondicional e que sempre tentou nos ensinar a sentir e praticar. Um amor que se aplica indistintamente a todas as pessoas e a tudo que nos cerca, de forma absolutamente compatível e coerente com a visão de mundo que sempre defendeu e que você julgou que só seria capaz de difundir através da ciência (com o livro que escreveu) ou pela prática da docência (você nunca conseguiu deixar de ser professor, né?). Grande engano o seu..... repetindo mais uma vez, estou certa de que sempre conseguiu se comunicar e difundir a sua bela cosmovisão, muito mais com suas práticas e exemplos do que por essas vias, às quais posso hoje identificar claramente os grande limites que encerram quando não há coerência com as ações que as pessoas empreendem em suas vidas cotidianas.

Sua gererosidade e capacidade de perdoar sempre foi tanta em tudo que fez, que algumas vezes nos foi difícil entender os pequenos, raros e tão humanos atos de egoísmo, vaidade e birra decorrentes de seu excesso de determinação que vez por outra lhe escapavam. Nos perdoe por isso, mas acho que a causa reside justamente no fato de você ter se feito sempre tão grande para todos nós, que nos era difícil mesmo te entender e te aceitar em sua humanidade. Estou certa de que, por mais que nos esforcemos, dificilmente conseguiremos alcançar o seu nível nessa lição.

Seu sepultamento foi lindo – se é que assim podemos dizer – e dentro de sua simplicidade, digno realmente do grande homem que você foi. Lá estavam todos que o amavam/admiravam ou que nutriam esse sentimento por aqueles que você gerou. Assim, sua partida se deu em meio a muita paz, equilibrio e suavidade, refletindomuito bem a vida que você teve e tudo que construiu. Também foi lindo depositarmos suas cinzas no local onde sempre desejou poder construir seu Centro de Ciência para as crianças .... lá tem mar, rio, plantas e muitos pássaros.... bem pertinho da natureza, que você sempre amou tanto......foi sua mulher que teve a idéia - ela que te conheceu e te amou mais que qualquer um de nós - e nós, prontamente a acatamos.... espero que tenha gostado e que permaneça feliz como você sempre foi.

Ao arrumarmos suas coisas para doarmos ... nos demos conta de quão pouco você tinha e precisou para viver a sua grandiosa e abundante vida. Foi triste e ao mesmo tempo muito intenso e lindo.... uma verdeira última lição de vida para todos nós.

Agora, quando você já habita outra dimensão, nos resta apenas cultivar a certeza de que, nesse momento, de forma totalmente integrada ao universo e ao lado do Pai eterno, você continuará a obra que iniciou aqui na terra, com toda a sua força e sabedoria, olhando por nós e por todos aqueles que de alguma forma tiveram a oportunidade e privilégio de caminhar ao seu lado, ainda que para alguns tenha sido só um pouquinho.

Da nossa parte (a família que constriu), estou certa de que todos nós seguiremos tentando ser igual a você quando “crescermos” e que nos empenharemos em transmitir às gerações que nos sucedem e às que ainda virão (que você não conhecerá) tudo de bom e valioso que nos ensinou.

Te amo muito, muito, muito.....

Sua Tequinha"

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